Somos muito apegados ao conceito de eu, de self. Temos como hábito
cultivar a nossa própria imagem. Talvez porque isso seja uma das consequências
do nosso instinto de sobrevivência. Ou porque a sociedade estimule o
individualismo. Independentemente das origens dessa percepção, o fato é que nos
vemos como únicos distintos e separados de tudo aquilo que nos rodeia. Nós
vemos como especiais mesmo sabendo que existem no planeta.
Isso faz com que seja muito difícil
conseguirmos enxergar o mundo através dos olhos do outro. Se estamos parados
num engarrafamento, temos a concepção de que queremos chegar a algum lugar e
todos os outros carros estão nos atrapalhando. Entretanto, todos ali estão
passando exatamente pela mesma coisa, querendo simplesmente chegar aonde se
quer chegar. Dizemos que estamos presos no trânsito, mas na verdade nós somos o
trânsito. Nós somos a fila, o ônibus cheio, a praia lotada. Estamos todos no mesmo
barco, mesmo que tentemos nos diferenciar com um carro mais caro, uma roupa da
moda ou ideias de vanguarda. Fazemos o que for necessário para combater a
concepção de que somos apenas mais um na multidão e acabamos reforçando o
abismo que existe entre eu e o outro.
Mas nos temos à nossa disposição um instrumento que pode ser muito útil
para favorecer a empatia – essa capacidade de se colocar no lugar do outro.
Esse instrumento é a fotografia. Mas ela só será útil para esse fim se
conseguirmos abandonar, por um momento, as reações automáticas que nos fazem
julgar tudo a partir das nossas preconcepções e de fato olhar, sem preconceitos
e opiniões. Quando vemos uma fotografia sem essa disposição empática, fazemos
apenas julgamentos autocentrados: eu não fotografaria assim, eu usaria
outra câmera, eu não viajaria para esse lugar, eu gostaria
de ter feito essa foto. E com isso perdemos a fantástica oportunidade que temos
de enxergar uma fração da vida do outro, a partir do ponto de vista do outro.
Ao mesmo tempo, temos a expectativa
de que os outros vejam as nossas fotos da maneira que não conseguimos enxergar
as deles. Postamos e publicamos fotos o tempo todo nas redes sociais, blogs,
fóruns… Esperando um pouco de atenção, “curtidas” e reconhecimento efêmero. E,
já que não conseguimos dar a atenção que buscamos, no máximo entramos num
esquema de “eu curto a sua e você curte a minha”. O que no fim resulta em
milhões de monólogos tristes e vazios – não porque não tenham valor em si, mas
porque a comunicação simplesmente não se estabelece. Todo mundo grita e ninguém
ouve. São assim as redes sociais.
E se, ao invés de tentarmos gritar
cada vez mais alto, deixássemos de gritar? E se apenas parássemos para ouvir?
Se esquecêssemos a pretensa maior importância daquilo que temos para dizer e
experimentássemos a incrível possibilidade de ver com os olhos de milhões de
outros, que está na ponta dos nossos dedos? E guardássemos para nós nossas
fotos, ou no máximo as mostrássemos apenas para quem realmente importa, em vez
de buscar freneticamente as aprovações que afagam o nosso ego por apenas alguns
segundos? Pode parecer assustador abrir mão da pouca atenção pela qual já temos
que nos esforçar tanto. Mais assustador ainda é deixar de cultivar o eu,
reafirmar a nossa importância, o tempo todo. Mas aí, por outro lado, talvez
possamos simplesmente ser livres.
Achei esse texto muito lindo e quem quiser saber mais segue o link ...
Dayane,
ResponderExcluirInfelizmente a sociedade está cada vez mais individualista, olha somente para si mesmo, nem mesmo para um prarente proximo, fala bonito e a atitude é zero.
Muito bom o seu texto crítico e sensível.
Beijos